A verdade sobre a vida de Doris Day fora das telas – e por qual motivo ela não era tão saudável quanto você pensava

Mais conhecida por sua marcante atuação em "Ardida como Pimenta", Doris Day já foi considerada a namoradinha de Hollywood. De modo notório, a atriz brilhou nos cinemas devido a uma série de fascinantes comédias românticas ao lado de Rock Hudson. Contudo, a vida privada da atriz - assim como a vida de seu antigo colega de elenco - mostrou-se não ser tão saudável quanto a sua personalidade pública. Portanto, o que exatamente Day estava escondendo de seus fãs?

De volta à Era de Ouro de Hollywood, Day era amplamente considerada como uma figura inocente em relação à sedutora Marilyn Monroe. A imprensa a exibia como alguém com quem os homens sonhavam em se casar e Monroe, por outro lado, era retratada como uma mulher com quem os homens desejavam ir para a cama. Day parecia mais do que feliz por fazer jus a essa reputação - nas telas, pelo menos.

Ao apresentar seu talento natural para o canto e seu senso de humor através da interpretação de vários papeis, Day encantou o público no mundo todo durante os anos 50 e início dos anos 60. Longe das câmeras, no entanto, as mulheres de Hollywood viveram uma vida com mais tragédia do que comédia.

Infelizmente, Day teve que lidar com diversos obstáculos em sua infância. Seus pais, William e Alma - que antes mesmo do nascimento de Day haviam perdido de forma trágica o primeiro filho deles, Richard -, separaram-se quando a futura estrela era ainda uma adolescente. Sua ambição de se tornar uma bailarina profissional também foi afetada quando teve uma de suas pernas seriamente ferida em um acidente de carro.

Entretanto, esse acontecimento traumático provou ser, de certa forma, um mal que veio para o bem. Enquanto Day se recuperava, ela descobriu um talento antes inexplorado. Inspirada por Ella Fitzgerald - a qual é uma artista que Day ouvia com frequência no rádio -, ela começou a cantar. Após receber lições de canto, Day conseguiu um trabalho no programa de rádio Carlin’s Carnival da WLW.

Foi assim que um dos ouvintes do programa, o líder do grupo Barney Rapp, ficou impressionado com o que ouviu e, então, ofereceu a Day - anteriormente conhecida como Doris Kappelhoff - um trabalho na orquestra dele. Após adotar seu nome artístico, a futura atriz passou a trabalhar com Bob Crosby, Jimmy James e Les Brown.

Day também foi bem-sucedida como cantora. Em 1945, por exemplo, ela conquistou seu primeiro sucesso com o hino da Segunda Guerra Mundial, "Sentimental Journey". Aliás, ela também esteve no Top 10 da Billboard com canções como "Till the End of Time", "I Got the Sun in the Mornin'" e "My Dreams Are Getting Better All the Time". Porém, foi a versão de "Embraceable You" que ajudou a elevar sua carreira a outro nível.

Os compositores Sammy Cahn e Jule Styne ficaram tão fascinados com o desempenho de Day nessa canção que colocaram seu nome para um papel no filme de Michael Curtiz, de 1948, chamado "Romance em Alto-Mar". Embora ela não tivesse experiência em atuar, Day recebeu o papel. Como resultado, quando esse filme e a sua música principal, "It's Magic" explodiram, ela se tornou uma estrela tanto das telonas quanto das paradas musicais.

Assim, após Day conquistar seu primeiro single número um em 1948 com "Love Somebody", ela apareceu em musicais românticos como "No, No, Nanette", "Meus Braços Te Esperam" e "Sonharei com Você". Com base na história de vida do compositor Gus Kahn, o último destes filmes se transformou em um sucesso recordista de bilheteria. Em 1953, contudo, Day alcançou o papel determinante de sua carreira.

É um fato que Day consolidou seu lugar na história de Hollywood com sua bela atuação principal no musical "Ardida como Pimenta". Um de seus números mais famosos, "Secret Love", também ficou no topo das paradas e até ganhou um Oscar de Melhor Canção Original. A onda de ouro da estrela prosseguiu após isso, atuando em "Com o Céu no Coração" e contracenando com Frank Sinatra em "Corações Enamorados".

Entretanto, Day estava disposta a provar que ela poderia fazer mais do que bancar a namoradinha em seus filmes. Em 1955, portanto, ela apareceu nas telas como a vocalista Ruth Etting no drama "Ama-Me ou Esquece-Me", recebendo a aclamação da crítica por tal papel. Day também trabalhou com os lendários Alfred Hitchcock e James Stewart no suspense "O Homem Que Sabia Demais" e protagonizou o filme noir "Julie".

Em 1957, no entanto, Day voltou a ser mais cômica e musical com "Um Pijama para Dois". Ela também passou a compartilhar a tela com Clark Gable em "Um Amor de Professora", Richard Widmark em "O Túnel do Amor" e Jack Lemmon em "A Viuvinha Indomável". Em 1959, Day criou uma parceria criativa com Rock Hudson que acabou resultado em um sucesso de bilheteria.

Hudson e Day, que se tornariam amigos de longa data, fascinaram o público dos cinemas em "Confidências à Meia-Noite". De forma memorável, Day também recebeu sua primeira - e surpreendentemente sua última - indicação ao Oscar pela atuação como Jan Morrow. Essa popular dupla se reuniria mais tarde para contracenar em comédias românticas igualmente cativantes, como "Não Me Mandem Flores" e "Volta, Meu Amor".

Day estabeleceu sua posição como estrela feminina número um dessa era com papeis em "Já Fomos Tão Felizes", "Carícias de Luxo" e "Eu, Ela e a Outra". Escrita, em partes, pelo filho de Day, a música-tema deste último filme também se tornou um dos maiores sucessos da atriz. Acontece, no entanto, que seu reinado como rainha das bilheterias estava prestes a terminar repentinamente.

Quando o movimento de contracultura da geração pós-guerra começou a ganhar espaço, a figura inocente e nostálgica de Day saíram de moda. Também não ajudou o fato de ela ter sido cruelmente rotulada pela mídia como "a virgem mais velha do mundo". Depois de "A Espiã de Calcinhas de Renda", de 1966, a sorte de Day mudou, uma vez que ela nunca mais experimentou o nível de sucesso que havia conquistado anteriormente.

A atriz também recusou diversos papeis importantes os quais teriam auxiliado o público a vê-la sob uma nova luz, sendo o mais famoso deles, sem dúvida, o papel de Sra. Robinson no clássico "A Primeira Noite de um Homem", de 1967. Porém, a aparente crueza do roteiro do filme não agradou Day, logo, ao recusar tal papel, ele se tornou da atriz Anne Bancroft.

Então, depois de aparecer no filme "Tem um Homem na Cama da Mamãe", de 1968, Day optou colocar um fim em sua carreira no cinema. Essa decisão, no entanto, não a impediu de continuar a atuar, posto que ela trabalhou em seu próprio e homônimo programa de televisão na CBS. Durante os cinco anos de sucesso da série, Day também apresentou seus próprios especiais nas telinhas. Contudo, quando o "The Doris Day Show" chegou ao fim em 1973, ela resolveu que já era o suficiente e se retirou da vista do público.

A estrela acabou retornando aos holofotes em 1985 para o programa "Doris Day's Best Friends", embora a rede de televisão Christian Broadcasting Network tenha tirado a série do ar após apenas 26 episódios. Entretanto, Day não foi completamente esquecida nos anos que se seguiram. Em 1989, por exemplo, ela foi homenageada com o renomado prêmio Cecil B. DeMille nos Globos de Ouro. Já nos anos 90, tanto uma coletânea de maiores sucessos quanto a aparição na trilha sonora do filme australiano "Vem Dançar Comigo" ajudaram a apresentar a música de Day a toda uma nova geração.

Fora do mundo do entretenimento, Day ajudou a estabelecer a instituição Actors and Others for Animals em 1971 e, sete anos mais tarde, criou a Doris Day Animal Foundation. Ela também co-financiou um centro de resgate e adoção de cavalos, o qual foi nomeado em sua homenagem e também fundamental para dar início ao evento anual chamado Dia da Esterilização dos Estados Unidos. Aliás, foi em 2004 que George W. Bush concedeu a Day a Medalha Presidencial da Liberdade por seus serviços tanto à indústria do entretenimento quanto à vida selvagem.

Day continuou a deixar sua marca nos anos 2000. Em 2008, por exemplo, ela recebeu um prêmio Grammy de Contribuição em Vida e, quatro anos depois, um terceiro prêmio Grammy Hall da Fama. No entanto, a atriz aposentada parecia menos interessada em receber um Oscar Honorário. Na verdade, ela chegou a rejeitar as ofertas da Academia em várias ocasiões, sugerindo, talvez, que deixassem sua carreira cinematográfica no passado.

Então, em 2011, com 89 anos de idade, Day conquistou o Top 10 das paradas musicais no Reino Unido. Um álbum de faixas inéditas, chamado “My Heart”, fez com que a estrela se tornasse a artista mais velha a realizar tal proeza com material novo. Após quatro anos, Day foi convidada pelo vizinho Clint Eastwood para encenar em um filme dele, a atriz, porém, recusou educadamente.

Todavia, essa não seria a última vez que todos ouviriam falar de Day. Surpreendentemente, tal ícone das telas concordou em ser entrevistado pela revista The Hollywood Reporter em abril de 2019 - logo após completar 97 anos. Quando questionaram sobre o papel favorito interpretado por ela no cinema, Day respondeu que havia sido o papel principal do filme "Ardida como Pimenta". Day acrescentou: "Eu era uma moleca e Jane era uma personagem muito divertida de interpretar. É claro, a música também era maravilhosa. 'Secret Love', especialmente, é uma canção bonita demais".

Infelizmente, apenas algumas semanas após essa rara entrevista, Day faleceu devido a uma pneumonia. Representantes de sua instituição homônima de caridade aos animais confirmaram a notícia e também disseram que ela havia morrido rodeada de entes queridos em sua casa em Carmel Valley, Califórnia. Não foi surpresa, então, quando uma série de homenagens vindas das estrelas de Hollywood, passadas e presentes, surgiram.

William Shatner descreveu Day, por exemplo, como "a queridinha do mundo e amada por todos". Enquanto isso, Goldie Hawn comentou: "A grande Doris Day nos deixou e levou um pedaço do sol com ela. Ela iluminava nossas vidas e vivia sua vida com dignidade". Já o veterano de Hollywood Carl Reiner, recordou-se da falecida estrela: "Há apenas uma semana, entrei em contato com ela e a dei as boas-vindas ao Clube do Ator de 97 anos".

Naturalmente, a maioria das reportagens sobre a morte de Day se concentrou em seu período de ouro como a queridinha de Hollywood. Porém, ainda que a vida da atriz possa ter parecido perfeita nas telas, foi uma história muito diferente na vida real. A verdade é que Day passou por inúmeras dificuldades ao longo de sua brilhante carreira.

Ao final da adolescência de Day, por exemplo, ela se casou com Al Jorden - um trombonista que conheceu enquanto se apresentava com Barney Rapp e sua orquestra. Infelizmente, porém, a união deles estava longe de ser feliz, dado que Jorden era um esquizofrênico abusivo o qual quase matou o filho ainda não nascido do casal. Após saber que sua esposa estava grávida e não queria abortar, o músico a atacou brutalmente.

Felizmente, a criança ainda no ventre de Day sobreviveu ao ataque. Somente um ano após o nascimento de Terrence Jorden, seus pais seguiram caminhos diferentes. Em 1967, o pai de Terrence tirou a própria vida e se presume que Day não tenha chorado ao ouvir tais notícias.

Assim, três anos após a separação de Day e Jorden, em 1946, ela disse "sim" mais uma vez a outro músico. Ele chamava-se George, era saxofonista e irmão da atriz Virginia Weidler. Aliás, esse segundo casamento não durou muito mais que o primeiro. No final da década, a estrela era novamente uma mãe solteira.

Por sorte, Day parecia ter encontrado o amor da vida em 1951, período este em que ela se casou com Martin Melcher - um produtor de cinema o qual também se tornou seu agente. Melcher adotou oficialmente o filho de Day e a dupla parecia desfrutar de um casamento feliz até a morte precoce de Melcher, em 1968. Foi após essa perda que Day descobriu que seu terceiro marido estava, na verdade, escondendo um segredo.

Sem que Day soubesse, Melcher vinha gastando a fortuna duramente conquistada dela durante todo o casamento. Aliás, as más notícias não terminam aí. Melcher não só desperdiçou 20 milhões de dólares durante esses 17 anos juntos, como também mergulhou a atriz em uma séria dívida. Parece que tanto Frank Sinatra quanto James Garner já desconfiavam há tempos do marido de Day e de seus hábitos.

É evidente que Day tentou recuperar parte do dinheiro, o qual Melcher havia gasto, e fez isso processando Jerry Rosenthal. Rosenthal havia sido sócio do falecido marido da atriz e também tinha servido anteriormente como seu próprio advogado durante seu segundo processo de divórcio. O tribunal decidiu a favor da estrela de Hollywood - ainda que, até 1979, ela não tenha visto um centavo da indenização que lhe havia sido concedida.

Day também ficou chateada ao saber que Melcher havia assinado, sem seu consentimento, um contrato para ela apresentar seu próprio programa. Em uma entrevista de 1996 à revista OK!, ela revelou: "Foi horrível. Eu realmente não estava muito bem quando Melcher faleceu e a ideia de ir à televisão era insuportável... Eu também tinha vários contratos assinados para um monte de especiais de TV - tudo isso foi feito sem ninguém me perguntar antes".

Day não sofreu apenas financeira e profissionalmente nas mãos de Melcher. O terceiro marido dela era também um homem controlador que a pressionava a trabalhar de modo constante. Como resultado, Day começou a ter problemas com sua saúde mental, tanto que enquanto gravava "Ardida como Pimenta", por exemplo, ela lutou contra crises de pânico.

Então, um ano após a morte de Melcher, Day encontrou-se, sem querer, em um dos casos de assassinato mais importantes da década. Antes de matar impiedosamente cinco pessoas em Los Angeles, os seguidores de Charles Manson planejaram matar o filho da atriz, Terry. Manson queria vingar-se do produtor musical devido à recusa dele em trabalhar no álbum do líder da seita.

A turbulenta vida amorosa de Day continuou quando ela se casou com seu quarto marido, Barry Comden, em abril de 1976. O garçom conquistou a atriz ao distribuir comida para seus vários animais de estimação quando ela saiu do restaurante em que ele trabalhava. Contudo, mais uma vez, o casamento não durou muito e, em 1982, a estrela se divorciou novamente. Comden alegou, mais tarde, que sua ex-esposa estava mais interessada em cuidar de animais do que dele.

Após o fim desse quarto e último casamento, Day dedicou-se ao seus diversos trabalhos de caridade voltados aos animais. Ela também foi ajudada nesses projetos por Terry. Entretanto, em 2004, esse ícone das telas ficou devastado quando seu filho, com apenas 62 anos, faleceu tragicamente de câncer.

Essa não foi a única grande perda que Day sofreu em seus últimos anos, pois, em 1985, o colega de elenco e amigo de longa data, Hudson, tornou-se o primeiro rosto extremamente famoso a morrer de AIDS. O ator não se assumiu homossexual ao longo de sua carreira, tendo sua sexualidade confirmada apenas após sua morte.

Apenas um ano antes da morte dele, Hudson apareceu visivelmente doente no programa de curta duração de Day na CBN. Na biografia de Mark Griffin sobre o antigo ídolo, Day cita que, naquela época, "Rock estava muito doente. Mas eu só ignorei isso, saí e coloquei meus braços em volta dele e disse: 'Estou contente em vê-lo'". A atriz também foi elogiada pela comunidade gay por permanecer leal a seu amigo durante esse período em que o medo em relação à AIDS estava no auge.

Portanto, a vida pessoal de Day possuiu definitivamente uma considerável dose de tragédia e decepção. Aliás, apesar de sua ausência no mundo do entretenimento desde a virada do século, a antiga atriz estava longe de ser uma solitária e traumatizada mulher como muitas vezes a mídia retratava. Na verdade, ela levou uma vida social ativa até o dia de sua morte.

De fato, muitos dos velhos amigos de Day admitiram que costumavam achar o rótulo de "reclusa" muito engraçado, considerando a frequência com que a estrela saía. A própria atriz certa vez deixou bem claro que o retrato que a imprensa fazia dela era muito distante da verdade. Ela chegou a dizer: "Minha imagem, posso assegurar a vocês, é mais faz-de-conta do que qualquer papel de filme que eu já interpretei".